Manifesto do coletivo Pó de Poesia

O Poder da Poesia contra qualquer tipo de opressão
Que a Expressão Emocional vença.
E que o dia a dia seja uma grande possibilidade poética...
Se nascemos do pó, se ao morrer voltaremos do pó
Então queremos Renascer do pó da poesia
Queremos a beleza e a juventude do pó da poesia.
A poesia é pólvora. Explode!
O pó mágico da poesia transcende o senso comum.
Leva-nos para um outro mundo de criatividade, imaginação.
Para o desconhecido; o inatingível mundo das transgressões do amor
E da insondável vida...
Nosso tempo é o pó da ampulheta. Fugaz.
Como a palavra que escapa para formar o verso
O despretensioso verso...
Queremos desengavetar e sacudir o pó que esconde o poema...
Queremos o Pó da Poesia em todas as linguagens da Arte e da Cultura.
O Pó que cura.
Queremos ressignificar a palavra Pó.
O pó da metáfora da poesia.
A poesia em todos os poros.
A poesia na veia.


Creia.


A poesia pode.


(Ivone Landim)



sábado, 31 de dezembro de 2011

Retrospectiva 2011

Retrocedemos ou avançamos?
O que fizemos de bom juntos
É disso que estou falando
Não falo dos sonhos individuais
Das metas profissionais
Dos amores que amamos
Qual o total de todos os anos
Na sociedade que inventamos
Fomos massa manobra
No velho e novo continente?
Para os pobres não houve sobra
Nem a paz alcançou a gente
Quantas vezes a vista grossa
Fez de conta não ver o errado
E a boca se fez torta
Por não dizer o que devia dizer
Estamos no velho mundo novo
E ainda não posso entender
Quem me dá feliz ano novo.

Poema de Aline Capistrano

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Entredentes

Um Favo de Mel pode ser azedo e amargo,
Depende do modo que traço.
Nessa doçura se esconde
Um amargor de passado.
Se esconde também entre os dentes,
Entre a língua e o sorriso
Um coração intranquilo
Um passarinho sem laço.
Nesse entredentes se esconde,
Nos entreabertos lábios,
Um desespero de gôzo,
Um doce que se torna amargo.

Poema de Isabela Vital

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

As nuvens não são mais de algodão
Marcam o céu em linha reta
No rastro químico da avioneta
Entre as de formato de coração
Poderia ser alucinação
Uma conspiração sobre o fim
Mas a estranha aparição
Sempre paira por cima de mim

Poema de Aline Capistrano

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Namorada do menino

Ontem eu vi a minha namorada,
estava tão linda e bem arrumada.

Minha namorada mora “loonge”
quase se esconde.

Ela é branquinha e leve uma mistura
da lua com a neve.

Minha namorada não me chama de
meu amor e ainda não disse que me
ama.

É bela feita uma linda flor perfumada.
Ela é minha paixão sutil e inflamada.

“Ó” não conta pra ela que ela é minha
namorada, ela ainda não sabe de nada.


Poema de W.Marques

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

LUAR TÊNUE



Luar tênue
Sobre amor na relva
Doce pecado

Arnoldo Pimentel


Este poema é parte integrante do livro NUVENS
Para adquirir entre em contato
Email: arnoldopimentel@gmail.com

 

Quer uma dica de boa leitura poética?
Visite e siga o blog do Fabiano Soares da Silva
http://fabianopoe.blogspot.com

sábado, 24 de dezembro de 2011

DEUS É FRÁGIL (MENSAGEM DE NATAL)

Ainda há pouco
Eu estava bebendo uma cerveja num bar
Algumas crianças estavam brincando por ali
E uma menininha de cabelos louros
E olhos azuis
Mostrou-me como o Super-Homem e o Batman são frágeis
Os pais das crianças estavam do outro lado da rua
Da rua tão deserta
Um deserto tão ermo que não tinha nem Esfinge para nos olhar
Ou proteger as crianças
As crianças estavam tão sozinhas
Que pude perceber o quanto Deus é frágil
Deus é tão frágil quanto o Super-Homem e o Batman
As portas estão fechadas
E as luzes logo irão se apagar
Deus vai proteger sim
As crianças que estão em seus lares
E não as que estão pelas ruas a vagar
É tão triste ver crianças num bar

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O pregador

Ainda cedo, o sol meio acanhado de agosto deu lugar ao vento que embaralhava nuvens e cabelos.Caminhava pela praia quase deserta,dedo em riste,o livro de capa preta debaixo do braço, fato já amarfanhado ,gravata torta,olhar orgulhoso,sobranceiro.Tentaria caminhar sobre as águas ? Não,caminhava ao léu,gritando aos ventos as maravilhas daquele livro : parava,lia e seguia em frente,uma cadencia devota.Concentrados jogadores de vôlei ignoravam os presságios da chuva e o vigor da sua oratória.Não parecia transtornado, apenas alguem que cumpria o seu papel,numa praia esvaziada de uma tarde cinzenta.Um homem na meia idade,cabelos grisalhos e assanhados em estrelada confusão em órbita da cabeça , olhar cansado e determinado,arengando ás ondas,a massa líquida a beijar-lhe os sapatos,no barulho obsequioso do mar.Isaías e a Tessalonica entre os últimos e friorentos banhistas,fugitivos da chuva e do anoitecer rastejante.Marchava contra o vento, ladeando os garis,em mansa determinação.Voz clamante na praia deserta,deu por fim a sua lida,encostou na velha barraca e ordenou uma lapada de cachaça , na profundidade bíblica de sua voz, sedenta de Deus e de aguardente.

Conto de André Albuquerque

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Brasis de meus polegares

Gangrenou-me um índio na boca, tive que me operar por um sisal de cactos. Meu pai, fumando um cachimbo de pátria que de vapores era fumo, teve que ser padeiro.
Eu nunca vi terras de Vera Cruz que não fosse pelas fotografias que sempre existiram nos açores de outros voos.
Eu nunca vi India tão para lá do Ganges do meu bidé.
Eu nunca consegui domar este meu pé imperialista, esta minha sede de ser maior que um oásis, este meu camelo dorso onde me aninho.
Eu nunca consegui ser água de lágrima, rio de pó.
Sou preta feia, sou Cesária bem morna com o meu país.
Sou as Franças da menina puta, que um dia, por não saber a quem endereçar a angústia, se diluiu num rio e por via disso os peixes, mais secos que enguias, tiveram que mendigar o pão pelas portas, escorregadios.
Eu sou a miséria de um grito sem fronteiras. Um trapo arregaçado, um prepúcio.
E raios se não me rasgo, se não me caravelo, se não me enfuno nestas velas lusas.
Dane-se esta merda doce de ser português, comida às colheres no jardim florido de uma cigarra vadia.
Era prima de uma formiga, mas foice*.

*Símbolo com que se representa o Tempo e a Morte.




Autor: José Ilídio Torres

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

"acto-definido"

não há, sequer este lado pendente de apostas e frio
qual rescisão e colheita das minhas obsoletas páginas
ao exercício. ao costume referido e ora, frente ou subtil
se for.. seja o acaso de preferências às outras cartas

então me fiz acreditar em revelia de reles putas-mentiras
ao conto da corda refém e breve, já nítida quanto pérfida
por elegia deste eco entregue e que não perdurou dois dias
ou às noites vazias que declinavam-se em poesia-nua/léxica

ah, eu.. tão tolo como sou, me deixei trafegar o pouco-sonho
qual arremesso de impulsão à morada alheia do desencontro
e na palavra retocada, maquilada de vileza, (afora)me deitei..

ah, eu.. em esboço desta vénia, ainda assim, me previ à queda
tal etérea imagem da planificação em costura e reles-oferta
e. na palavra desfiada, pincelada de impurezas, (agora)te sei



Soneto de Azke

domingo, 18 de dezembro de 2011

Expulsem-me deste curral de mulas
façam-me esse favor de imediato
Fiquem com esta merda os caçulas
que sempre encontram pedra no sapato

Não tenho mais paciência para isto
tenho o luso a gangrenar-me a alma
começou por um pequeno quisto
tamanho de um dedo e agora da palma

Não volto mais aqui, é de vez, eu juro
tira-me o tesão, quebra-me a vontade
Vejo túneis onde dantes havia um furo

Fiquem por isso com a vossa puberdade
que eu aninho num broche ao futuro

Poema de José Ilídio Torres

sábado, 17 de dezembro de 2011

Lascas

Decidi. A ti, deixarei o relato das horas meias de fome e sede e os entalos que me fizestes engoli quando minha retina era invadida por rebanhos de luas em noites frias... tão frias que o orvalho nascia cachoeira salgada nas pedras de minha face. Deixarei as fotos dos caminhos que nunca percorri; os risos gravados em um vinil reciclável para que tu possas jogá-lo ao lixo se quiseres, ou pendurá-lo na parede como relíquia de um tempo ultrapassado e antigo, pois não há mais onde tocá-los. Mas se tua lembrança de mim for tão nítida (como tola penso) poderás ouvir estes risos e também o meu pranto ao fechar teus olhos; o barulho dos trilhos de um trem sem gare, sem condutor... sem nós. O vinho deixarei nas taças, aquelas com a digital de nossas bocas na margem, e lembrarás o quanto nos afogamos no tinto emergindo ainda mais vivos. Embrulharei com cuidado dois espelhos com a minha imagem. A mulher que fui e a que sou hoje. Verás a marca de nascença e a marca feita... não, não por ti... Minha infância deixarei em um desenho vivo! Guarda-o. Fecha-o aos sete versos, posto que talvez seja a única coisa alegre que eu tenha e que antes de ti tenha valido a pena. O que sobra de mim é a fumaça dos cigarros, névoa que dilata infinitamente as falhas, o ridículo no monóxido de carbono, o escuro, o silêncio... e isto não se tem como herança....



Poema de Maria Verde

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Mama




Ah, Mama África...
Por que nos separamos?
Os olhos brilhantes em Kilimanjaro
conseguem ver os filhos flutuando
nos oceanos e mares em seus navios continentais?

Com que memória você nos percebe
- nós, que te vimos chover o rosto
quando partimos para adolescer
entre os rios no Crescente Fértil?
Nós mesmos que buscamos
amadurecer entre os dois sóis?...
Consegue ver o que guardamos
da sensibilidade dos mundos do Nascente?

Pode notar tudo o que orquestramos no
pensamento
entre as pedras e arbustos das Polis ocidentais?

Porque foi assim, Mama África, com essa
infância, juventude
e vida pronta, que nos deixaste partir de vez para
esse mundo
de terra, água, fogo e ar...

Marcos Afonso

A luz dos olhos de Luci

Olha o Tempo! Olha o vento, através de tantos zeros!
A distância dum pensamento a percorrer milhões de anos.
Camadas da matéria adâmica, são ossos e sentimentos.
Oh, Luci! Luz vinda das cinzas embalada por vulcões,
Num magma de sonhos sob um céu miocênico incandescente.

Ampulhetas do Tempo, somam-se as estalactites e nascimento,
Quando o teu semblante olhava o futuro de teus descendentes,
As constelações desenhavam sobre a Terra, os contornos do destino.
O que era úmido e verde, tornou-se árido, corrosivo, restos de cascalhos.
Hoje são apenas memórias escavadas, no vento aquecido pelo passado.



O que viria a existir após se extinguir a última centelha dum olhar iluminado?
Seriam as estrelas, vindas de olhos ingênuos, a derramar sangue e destruição.
A sabedoria latente, como uma semente de gente, preste a explodir.
Mentes abstratas a procura de Deus, através de mares de incertezas.
Animal bípede e marinheiro ancorado no fundo da alma de todos nós.

Escavar o Tempo, expor teus ossos ao relento, além da eternidade,
Procurar desejos soterrados a milhares de Luas e estrelas fugidias.
Do nascer das auroras até as infinitas primaveras, tua luz irá florir,
Sonho onde o homem jamais irá pousar, seja dum sputnik, ou apolo.
Uma Deusa da fertilidade, se sobreporá aos Deuses do Olimpo.


Poema de Airton Parra

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Morro-me

Morro-me

Em cada alegria, em cada desgosto

Em cada copo vazio

Morro-me de fome pela barriga cheia

Morro-me



Num sol-posto, numa chuva em pleno Agosto

Num cálice de veneno que se bebe como vinho

Num suspiro prolongado

Morro-me por centímetro quadrado



Morro-me em milhas, em polegadas

Nas encruzilhadas dos caminhos



Morro-me em quarteirões, em alqueires

Morro-me em Alentejos tão grandes como Minhos



E nesta consciência de que me morro satisfeito

Tiro-me medidas, escolho a madeira

Faço um poema do melhor tecido

Fumo-me


in: «Os poemas não se servem frios» Temas Originais 2010

Poema de José Ilídio Torres

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

"(ela.)Niveal,"

habita-me! à dita reverência consumida de qualquer calor..
desvia meu pêndulo sob o restante deste alarido alvo-coração
lacerado. e posto às páginas de letras deferidas por obsessão
ora, habita-me à pele que te possui um lapso de filme em torpor..

aqueda-me! qual emancipação de lar obstuso, tal um enigma irreal
cala o meu desejo de sequências e pecados, e(de) tentar ainda mais..
meu exercício, meu arbítrio de continuar-te à metade de ti(tão..) voraz
ah.. aqueda-me em escultura do teu corpo livre em nú desfile carnal

ora.. não me vê em correntes que te seguem com as pontas dos olhos?
não concede o teu tempo a este pátio de pilhérias e paragem de espólios?
incidência. de tentar-te à uma fracção imersa em dependência que te curva..

ah.. eu, deixaria os meus arremessos de lado, culparia meus (todos)pecados
minhas breves decisões, ora dormentes, deste inapto alvo/palco/pacto vago
ah..qual ilusão à pele que te toca?ao sonho que te sobra?(e.chuvas/e.chuvas?)

Soneto de Azke

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Retrato

Queria que você ainda fosse a mesma criança pra eu te amar novamente.
Queria encontrar o mesmo sorriso em seu rosto...
Quem sabe tudo seria diferente?
O retrato amarelado diz que o tempo passou rápido demais e sequer me esperou... E eu fiquei para trás.
No entanto seus olhos não perderam o brilho; Continuam iluminando meu estranho caminho.
O coração congelou e a alma partiu arrastada pelas águas do rio...
E eu fiquei só. Eu e você no retrato amarelado.
O sofá marrom, seu short curto e camisa xadrez.
Deixe-me mentir que você é a mesma criança.
Deixe-me inventar qualquer esperança...
Porque o sol ainda toca teu rosto e o céu finge não ver tantos desgostos...
Eu ainda posso ouvir a chaleira apitar e posso ouvir suas risadas no jardim...
Não! Não jogarei seu retrato na fogueira. Te esquecer? Nem que eu queira!
Um anjo sempre vem me ver, larga meu cálice de fel e vai embora;
Já nem olha mais em meus olhos; Cabisbaixo, chora do lado de fora...
Enquanto eu fico só... Eu e você no retrato amarelado.
Eu e você e um coração despedaçado...

Poema de Léia Carmona

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Era uma vez outra vez

Abro a página com um bisturi afiado

Afasto os órgãos que não interessam

Irrompo pelo estômago das palavras



Aspiro o sangue, limpo as impurezas

Rasgo-o com precisão pela boca

Retiro-o de uma só vez vitorioso

Clampo a ferida aberta e morro



Um dia serei árvore e novamente papel

E estômago e bisturi afiado

E uma pleura aberta até ao chão



E depois palavra e depois página

Veia e artéria

E agarrado aos pulsos um coração



Bisturi afiado para começar tudo de novo



Se valer a pena, estou disposto a autopsiar-me

Órgão a órgão para cima de uma marquesa

E aprender a começar as frases por era uma vez


in: «Os poemas não se servem frios» Temas Originais 2010

Poema de José Ilídio Torres

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Prosas poéticas

Vou suicidar-me no primeiro raio de sol

Vou suicidar-me no primeiro raio de sol. Já testamentei os meus parcos haveres: todo o sal do mar e as sereias pornográficas que copulam com o vento norte. Uma gaivota de crude.
Já me despedi de quem gosto: poetas sem lei, que vivem para além da morte, ledos.
Dei carta de alforria às prostitutas que trabalhavam nas esquinas dos meus olhos, encerrei os bordéis sujos nos meus dedos.
Promovi os pedintes a monarcas, fiz dos enjeitados nobres patriarcas.
Deixei dito que mais nenhuma criança cresceria antes do tempo, que a única lei vigente passaria a ser a da brincadeira e dos afectos.
Que o poema fosse a única matéria leccionada nas escolas, sítios amplos sem portas, janelas ou tectos.
Assinei papéis doando os meus orgãos: o fígado para ser transplantado num homem são, mas azedo e sem coração.
Os pulmões experimentados num réptil, os meus rins enxertados em árvores de fruto.
Paguei adiantado às carpideiras com o dinheiro sujo que ganhei amamentando o sistema, mesmo não tendo tetas, pregador de certezas, pastor crente de um rebanho de petas.
Espero que chorem, esperneiem, larguem baba e ranho por mim, e no final das exéquias se sirvam canapés, se leiam poetas malditos e o vinho esgote.
Para onde vou não preciso de memória, a palavra saudade deixará de fazer sentido, o próprio verso, mote.
Vou suicidar-me no primeiro raio de sol. Espero que me trespasse de luz o coração.

Ninguém morre e vai para o céu

Ninguém morre e vai para o céu.
Até se pode morrer e ir para um lugar abaixo de nós. Raiz de árvore, seiva de flor, estômago de pássaro.
Nesse caso a alma não levita, entranha-se na terra fecundando-a.
Há um espírito universal em tudo o que vive. Provavelmente até numa pedra. Na conjugação de todas as coisas. Há um espírito que vive numa obra de arte, nas páginas de um livro, na anatomia da memória. Na história.
A passagem de cada um de nós pela vida alimenta esse espírito, o que nos coloca a todos como irmãos. Filhos de uma mesma mãe.
Estar à espera de um céu depois de morrer, seja por via de uma licença passada pela igreja, seja por via da própria espiritualidade de cada um, é um pensamento profundamente redutor.
A função de cada ser nesta vida, é ser melhor. Signifique isso a capacidade de irmos perpetuando a beleza das coisas e das suas emoções, a nobreza dos gestos e da partilha, mesmo que cada um cometa erros, ou sinta que falhou num determinado momento.
O espírito de cada um realiza-se num todo. Não existe um qualquer lugar marcado no céu, não existe propriedade nem o seu direito.
A capacidade destrutiva do Homem faz parte do ciclo infinito da vida. A terra será uma rocha um dia, mas haverá sempre uma semente de liberdade a romper o chão, a vir da água, a trepar às árvores, a nascer do ventre de uma mulher, seja até num outro lugar.
A história da terra escreve-se em poema, a vida… é uma prosa só.


Autor: José Ilídio Torres

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Intervenção cultural de conscientização sócio-ambiental








O poeta e ator Marcio Rufino



O ator Ramide Beneret encarna seu personagem Vô Mustafá






A poeta Ivone Landim







Com o apoio da FASE Rio o Centro Cultural Donana realizou na manhã de domingo do dia 4 de dezembro uma intervenção cultural de conscientização sócio-ambiental no bairro Piam em Belford Roxo. O grupo Pó de Poesia com o grupo de Capoeira Palmares se apresentou no evento que teve exposição de Artes plásticas, fotografia e realização de grafites.

Fotos: Caetano Daniel.

domingo, 4 de dezembro de 2011

"mapear-te.."

morada. vertente da conduta pós-pele e alta de febres
à cada. procura voraz de entreter um prévio coração
(este!)oh, doce mente.. tão doce e latente concussão
por chamada tarja de quedas, ora quimera.. ora se perde.

por intuito. hábil, de volteio alheio aos livres olhos teus
qual virtude. e deflagração em carne, pois: cópula-de-registro!
a mapear-te.. impulsão. por in.razão absurda, por risco
seja-me à carta que desapego, ou à letra que te escolheu

a este ponto raso, de margem contido: em lago frívolo
se for à hora primária de contacto, oh.. tarde deste palco!
se for à seiva da carne criada de pátrias, oh.. pecado adiado.

conflito.. evitado por inclusão e ruptura de visão alguma
ou, referência.. lista planejada à carga entretetida de lisuras
largue-me!! cubra-me ao véu que te prega ao céu mais ilícito

(algo perto, alvo fixo..)

Poema de Azke

Dois poemas de Aline Capistrano

Ceia profana

Dane-se o natal e o novo mundo
Deixem somente as rabanadas
As quais eu nutro amor profundo
Rimem heresias e maldições
Pendurem nas árvores os colhões
Pro inferno a poesia
O amor e a hipocrisia
Matem a razão meia noite
Depois sirvam vinagre
Partam o peru a foice
Sirvam na comadre
Bestas apocalípticas
Vergonha da sua nação
Na boca sempre um palavrão
Uma palavra prostituta
A língua falada é puta
A discórdia azeite
O ego um pedaço de pão.

Toco fogo no céu

Tem anjos demais para pouco céu
Alguns devem ir para o inferno
Abro as asas e aponto os réus
Dou a sentença
O céu é de quem o viu primeiro
O ultimo será mesmo o derradeiro
Comigo não tem ditado
Nem a puta da democracia
Aqui é por ordem de hierarquia
Acaso o céu não me aceite como juiz
Toco fogo nesta bagaceira
E tudo fica como fim de feira

Poemas de Aline Capistrano

serragem é o peito vazio

quando o mundo ainda era jovem
a poesia era o reino onde ninguém morre
testemunha o inferno
a raiz da ira
um pulso em flores
como uma árvore
que se dobra pelo vento e volta
porém, a mão não poderá jamais
ser maior que a palavra que empunha
destruindo de dentro para fora
como um prego em uma ferradura
ou um céu sem nuvens a trovejar
nesse imenso salão de baile chamado universo
o meu sangue é da mesma cor que o teu
a alma é imortal
e encontrar um motivo para não puxar uma palavra
em vão ou vã
é justo imortal e divino
os fios das harpas são deuses
mantém o vosso chão
para que tenham o ar da liberdade


Poema de Vânia Lopez

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Arqueologia

Vez ou outra
Dou uma espiadinha pela fresta da porta.
Olho o caminho percorrido
E sempre acho, em meio às pegadas,
Um pequeno tesouro esquecido e enterrado.

Uma mão estendida,
Um olhar compassivo,
Um sorriso no momento exato.
Uma palavra...

Encontro, também, remédios amargos,
Intramusculares,
Daqueles que doem muito,
Marejam os olhos e apertam o peito.

Não observo ossos
Deixados pelo caminho
Porque coisas mortas só assombram
Minhas noites de sono tranquilo.
Minha arqueologia é sobre
As coisa vivas, que pulsam
E me ensinam novos caminhos a percorrer.


Outro dia,
Em um desses passeios,
Encontrei o perdão, só,
A muito tempo esperando por nós dois.

E tento trazê-lo desde então.


Poema de Milton Filho

domingo, 27 de novembro de 2011

Canção da manhã

Nuvens de poeira na estrada
jipe serpenteando
multidão de bóias-frias em marcha
sol nascente se espalhando
quero-queros em revoada
gado ruminando no pasto
galões de leite fresco nas porteiras
ribeirão cantando sobre os seixos
suave ranger de rodas de carroça
galo cocoricando no galho do abacateiro
aboio de peão barítono apaixonado
brilho e tilintar das enxadas e das foices
pés de cafés sendo colhidos
som de berrante potente
abafando todos os outros sons,
tudo na mais perfeita ordem
e eu, voltando do baile
com a viola nas costas,
chutando as pedras do caminho...

Poema de Betusko

Abutres

Podres abutres,
vós destes o corpo do meu nome
Sem benzi mento ou caridade
ao voraz esquecimento.

Os dentes onívoros
Dessas aves insaciáveis
não imaginam a ressurreição
do outro corpo nominal
que desenvolvo no útero do verbo.


Poema de Jean Narciso Bispo Moura

sábado, 26 de novembro de 2011

Supernova

“Porque tu és pó e ao pó retornarás”
(Gn. 3:19)


A supernova
É flor de raios
Apavorando
Floricultores,
A tantos povos
A contemplarem
Imenso brilho,
Origem e fonte
De todo o riso,
Do todo o choro
E da pergunta
Sobre o que somos,
Para onde vamos.

A supernova
É nossa mãe
E nosso pai,
Deu causa a tudo,
Ao teu destino
E à nossa fé,
Gerou profana
Buracos negros
Insaciáveis
E até as unhas
Tão comezinhas
Do nosso pé.

A supernova
É geometria
A ejetar-nos
Um rubro espectro,
Etéreo aspecto,
A quintessência
De todo o cosmo.

A supernova
É substância,
Todo o minério
Do teu planeta,
O claro enigma
Do teu mistério.

A supernova
É ferro e cálcio
Carbono e boro,
Matéria orgânica
Do teu desterro
Em supersônica
Exsudação.

A supernova
É festa e luz,
Tão branca luz,
Tão fero brilho
È vida e morte
A explodir
No céu da China,
Em Cassiopéia
E na Serpente
Ao olho enorme
De Brahe e Kepler.

A supernova
De nada esquece
E a si requer
Matéria outrora
A ti emprestada.

A supernova
Está no fundo
Do altivo céu,
Além do véu
Do firmamento,
Na grande Nuvem
De Magalhães
Que se te espelha
Destino e halo.

A supernova
Não mente ou ri,
Te dá o dente,
Depois o toma,
É tua origem,
É tua esfinge
Espelho e berço
De todo o fim.

A supernova
É muito séria,
Térmico útero,
Fornalha cósmica
Colapsada,
A Sanduleak
Brilhando mais
Que a própria Vésper
A derramar-se
Por vasto céu.

A supernova
Encena os céus,
Condena os céus
Com raios gama
E raios-x,
Ponteia os astros
Do cientista
E do menino.

A supernova
Que tanto amas
Em ti reponta
E te reconta
A própria imagem,
O curso d’água
De toda a vida.

A supernova
É a inflação
De quente lóbulo
Que nos semeia
Novas estrelas,
A sementeira
Evanescente
Que te refaz
E degenera.

A supernova
Põe a serviço
Toda a matéria,
E novas nuvens
E nebulosas
Que te fecundam
E te inoculam
Veneno e pólen
Do céu longínquo.

A supernova,
O bronze e a pátina
De novas vidas
E novas Terras.

A supernova
Deu tempo ao homem
E o subtrai
Do solo ao cosmo.

A supernova
Te dá o câncer
E a rara chance
De redimir-te
Ignorado
E ignorando
O próprio acaso
De toda história.

A supernova,
A destrutiva
A destruir-se,
A destruir-me
E a construir-nos
Do pó sidéreo.

Felipe Mendonça -
Todos os direitos reservados

Beber essa coragem líquida...

trata-se da terra e da água
os dois lados da mesma moeda
amor eterno por um biquíni

revolta operaria
aguardando um assovio

passos da cama até a porta
leite evaporado

tua sombra na bainha das pernas
repousando na paciência do corpo
criando outra camada de mim

reivindicando a metade
na partilha de momentos felizes
(um duelo do que ainda vai doer)

como se a alma devesse fugir
... e o corpo não aceitasse

dor, só não me empunhe sem motivo
só não me embainhe sem alma

na incansável turnê de dentro
(que conversam ao mesmo tempo)
arredondando cada trilha nascente
do que jaz não vive mais em mim...

Poema de Vânia Lopez

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

VÊNUS

Algumas camisas estão

Penduradas no cabide
Esperando que o guarda roupa
Seja aberto
Para poder apenas
Por um instante
Ver o mundo lá fora
Sabendo que apenas uma
Será escolhida
Para passear

Este poema faz parte do livro NUVENS  de Arnoldo Pimentel
Para adquirir entre em contato
Email: arnoldopimentel@gmail.com

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

jaz um vermelho cheio de grama

chora o sapato negro
perdido nas lágrimas do céu

retalham o peito
anjos inconscientes da imensidão

desdenhosos demônios
de uma saudade carmim

fazes uma falta tão bruta
que a faca não alcança a alma
... morre a sombra em pedaços

(a pensar em mim)


Poema de Vânia Lopez

terça-feira, 22 de novembro de 2011

"carnália.."

carnália..

da pura sede por enredo e fim
ao momento lépido das culpas de mim
ao enunciado e corpo-caso de prévias
quais chamas agrilhoadas em peça

carnália..

minha carta desviada por intenção
assassínio veto que te comparei, é possível?
tal providência à margem de ata-criação
tal elemento evasivo ao que não me é por líbido..

carnália..

minha lenda de rendas e actos do corpo
tropo.. mentira e conselho dos olhos, e aqui
misantropo enleio de guardar-te aos poucos
oh, coloração da pele que tanto/tanto é de ti..

carnália..

prega-me à estaca que te ofereço
mata-me em noites infindas e das quais, esqueço
um.. lado desvio inoportuno conto de sinais
ah, eu.. deitaria o sol pra te ver(um quanto) mais..


carnália..

baixa a minha lâmina
segreda aos ouvidos, dor..
carnália, me acalma, me ama
ou:



dá-me fome(da) pétala do ventre que te roubou.

Poema de Azke

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

"áquila.."

ao lado.
(de cá)

vénia-tombada
(parte-tomada)
da água que me refere
(ou: confissão-imediata)
à: sensação-adjunta
em:
corpo-suave(ou: teu-único.)
queda da casa de causas..
(fonte: lúdica..)
às: asas repentes e lá mais, o que tiver de incisão.


preces sub-entendidas
escadaria da vaidade
(absurdo..)


à linha que me conflagra o desapego
é: arte-cênica
ébrio conto de moções
de
dúvidas
aos meus alheios e preventivos segredos(orações..)
às:
aspas..
em consumo de mentiras(culpas..)
de contacto e: ilusão.



a
linha..



tal alvo por execução aos meus desvios
empregos solícitos de fuga, mas:
eu,
sempre fico.





à exigência de querer mais um pouco
seja-me à lápide que deitarei um dia
seja-me, o retorno.. das minhas (ditas)canções.





ah-eu..



esqueci-me disso tudo..
o que vejo é o teu lado/pecado/conflito(impulso: fogo!)
e,
ainda.. frente.
em
paredes desiguais
eu,
esqueci-me de ter o registro
da calmaria em minhas mãos por remar à revelia
quando em


corpo/bússola, este contracto
este presuposto acto em vão, enfim






te vai.
(e: te cria/e te cria..)


Poema de Azke

Uma carta, um plágio

Milton, esta carta é só para lhe dizer
Que chegou o fim da linha.
E você sabe, é fato.
Você tentou, você lutou,
Mas cadê a competência?
Você não tem, aceite.

Os melindres dessa gente,
O rancor, a hipocrisia,
O olhar enviesado,
A falta, mesmo, de amor,
Como plantar neste solo infértil?

Arrume as malas, Milton,
Separe suas parcas sementes
E vá plantar batatas em outro sítio,
Outras terras...
Não fale de respeito aos surdos
E desdentados,
Porque não há paladar para tal ambrosia.

Não tente mais convencer os convencidos,
Os zumbis, as múmias...
Ame, apenas, como as pedras:
Ninguém as notam,
Mas sustentam edifícios.
E não tente tirar leite das nuvens,
Das brancas nuvens,
Das pálidas nuvens,
Ou daquela brisa em particular, são iguais.

Não esqueça você também, Milton,
Sim, você, também verme,
Hipócrita elevado ao cubo,
À potência de dez, mil, milhões...
Você, feito de átomos e moléculas,
Que irão se transmutar em matéria pútrida,
Banquete para ti mesmo, verme dos vermes.

Vá e não volte mais,
Senão quando for luz e competência,
E puder matar a sede e a fome dos miseráveis.
Até lá, meu filho, cala-te,
Porque é no silêncio que se tempera o espírito
E se forja a boa voz.


Poema de Milton Filho

sábado, 19 de novembro de 2011

Divina Perfeição

Verde vermelho
dourado prateado
lindas cores
lindas luzes
e brilhos
nessa época festiva
a esperança brota
(mais uma vez em nossos corações!)
Que lindo!
Que paz,
e que harmonia encantadoras!
É tempo de confraternização,
união entre seres, famílias,
brindamos à glória do nosso grandioso
Senhor
...
Depois?! ...
Ah! ... Confraternizaremos de novo!
Ziriguidum, é carnaval
folia, festa da carne (nua e crua) ...
E todos digam,
mais uma vez,
Amém!
Assim seja!

Jorge Medeiros
(19/11/2011)

Três poemas de Vânia Lopez

o que se escreve sozinho

canto a voz colorida da tela
as tardes quentes de longas tranças
mil girassóis cabem dentro da minha mão
como um vento curioso
sangrando a morte dos sapatos novos
em gritos largos
há na dor um brilho que cega
o gosto da sua boca
no dourado em contraste com as horas
que perseguem sem trégua
o frio turva
a morte espera na rua
tudo que sou quebra-se em mil espelhos
atrás da porta o vazio me recebe
em murmúrios cálidos
sofrido, vivo
arranhando a tristeza em lágrimas que calam
numa dor pintada na coragem de ser feliz
chorando o vazio que sente
no mais obstinado poema
rompe em pedaços
na sola do sapato de alguém...

na linha de alinhavar...

amor mergulhe nos gestos
armados de dentes de lírios
de mil nuvens afogadas no pêssego
observe até que meu corpo
se torne uma melodia
até poder entoá-la a plenos pulmões

rouba os lábios da noite
inerte no vale do seu umbigo
eu vivo como uma nuvem mergulhada no céu
morrendo no azul imortal
miserável e pleno
solto nas horas da tua sobrancelha

é como se eu não pudesse te reconhecer mais
para saber quem sou
acabo voltando para morrer
morro-te em ais na ponta do lápis

sem uma linha escrita
deixa-me em rostos mortos
penando por ti em sussurros estendidos
em jornais antigos

enche então o instante
como um anfitrião generoso
e uma refeição quente
num jeito de esquecer

ou deixa-me sentir a música parar
molhada de orvalho
que lentamente passa
como alguma coisa que se perdeu
num duelo de vestido sem asas...

Pode marcar a hora e o lugar...

venha bem vestida
na melhor roupa
como se fosse o último bolero
rasgando dentro de mim

beije-me demoradamente
me olhe do jeito que sempre sonhei

numa palavra rude
rasgue-se em pulsos suicidas
em plena Colômbia junto aos guerrilheiros

só não venha no meio de um banho no chafariz
muito menos na melhor noitada
sem futuro que ainda viverei
também não seja besta igual uma queda de chuveiro!

morte acho que vou te matar!
você que mata tudo...
vais morrer em decepção
...já ando morrendo há tanto tempo
(que posso respirar em seu pescoço)
-E te aviso:
a conta não fecha nunca!

(em mel e enxame)


Poemas de Vânia Lopez

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Você seria capaz de me amar?

(Poema dedicado aos seres incompreendidos.)

Você seria capaz de me amar?

Eu só queria entender porque não há flores em meu jardim...
Se ainda há tanto amor em mim.
Eu só queria entender porque não ganhei seu coração...
Se ainda há melodia na canção.
Mas você não ouviu, nem sorriu, nem descobriu a ferida sangrando em meu peito;
E meus sonhos, todos dissipados em seu leito.

A incompreensão arrebatou-me de seus braços e a tempestade desatou nossos laços.
E eu chorei, desesperei-me e gritei feito um louco nas esquinas sombrias;
Garrafas vazias, cacos espalhados, enfincados em meus pés descalços;
Sem seu abraço, sem seu abraço.

Não posso crer que Deus me barraria à porta da cidade onde há felicidade...
Se não fui eu quem escolheu ser assim; E tendo por companhia, uma solidão sem fim;
Se não fui eu quem tornou em cinzas espalhadas ao mar;
À procura de qualquer mundo que me acolha e não me faça chorar...

Mas se você me amasse, eu nem me importaria;
Porque saberia voar e cantaria aos quatro cantos...
Sim, eu saberia voar!
Você seria capaz de decifrar meu olhar?
Você seria capaz de me amar?

Poema de Léia Carmona

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Plágio

As correntes marítimas
Enxugavam minhas lágrimas,
Mas o sangue, não.
Os navios sabiam...
Velas infladas
Feito mulheres grávidas,
Anunciavam minha dor.
Resolvi caminhar sobre as águas,
Distribuir pergaminhos engarrafados,
Culpar a falta de um grande amor!
As correntes marítimas sabiam,
Os navios sabiam...
Todos, indiferentes,
Anunciavam a minha dor.
Menos Tu.

Poema de Milton Filho

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Caminhos

Não é com brandura que se forja um espírito brando,
Mas à marreta.
Por isso, não chore.
Não implore.
Sê digno...
Suporta!
De onde me vens pedir que te indique o caminho, a outro cego?
Abre tu mesmo, teus próprios olhos,
E, vê!
Pouco se me dá, o quereres beber de minha e ou, outras poças.
Acaso, não sabes tu, da fonte?
Acaso, te foi negado o acesso?
Ou, és GRANDE demais, para a estreita passagem?
Encolhe-te!

Poema de Clara-Mei

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

O dejeto

Ele flutua,
Causa asco,
Fede,
É humano? Não.
Ou sim.
Vai saber o que é este ser!

Mas, adubada as plantas,
Não ingerimos essa merda?


Poema de Milton Filho

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Um pouco de muitas....




Um pouco de Frida Kahlo
Chacoalhando a vida
Plantando flores na avenida
Colhendo pó, dor e despedidas.

Um pouco de Pagú
Arteira, amante do interno
Moderno da revolução,
Revoltada interrogação?

Um pouco de Maria...
Várias Marias,
Parida com manias
Intérprete de mim mesma.

Um pouco cigana
Sem umbanda, sem nome...
Cheia de cores, com flores na saia
Girando, gingando, cantando...

Um pouco indecente
Singela criança
Carente com dentes
Urgente semente.

Assusto...
Chuto o pau da barraca
Não temo ninguém e a nada
Intensa, ansiosa, corajosa...
Quando erro, boto a cara, não nego!

Sou lembrança...
Esperada do destino...

Sou dedicada às vidas que a minha deu.
Sou barulho...
Quando pensativa e muda,
Culpo a lua, a xingo de puta.

Tantas se encaixam em mim
Tantas moram em mim...

Sou muitas,
Sou nada,
Sou estrela
Sou terra batida
Sou fera ferida
Sou abrigo
Sou o ódio
Sou o amor
Sou poeta!

Escrevo para não morrer de dor
Sou quem você quiser,
Sou quem eu quero ser.
O que bem sabia de mim,
Não está mais aqui, deixaram morrer!

Camila Senna


segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Dois poemas de Joelma Maia

Anunciação

E que haja sempre um bom vinho
Quando os pirilampos alucinados
Com o cair da tarde nesses beirais
E mergulhados em passiva devoção

Os amantes infiéis dos rigorosos invernos
Solidários cantam em seu mais grave tom
A canção dos aflitos. Benditos sonâmbulos!

Perdidos na boca da noite fria,
Essa aflita viúva desamparada
Que propaga a solidão dos véus

Imortal seja essa ponte passiva
Para tão espetaculosa anunciação!

Um minuto de silêncio

E escuta-se apenas o murmúrio
Das águas que descem
Para regar essas sementes
Agora jazem soterradas

E para selar esse momento
Ouvem-se apenas águas, águas...
Mares que brotam de tantos olhos
Que já mortos, ainda vêem!

Poemas de Joelma Maia

domingo, 6 de novembro de 2011

Homenagem a Carlos Drummond de Andrade no Novo Blog Comtexturas

A Carlos Drummond de Andrade

Nasceste de carne e osso.
E de tanto viver entre montanhas e respirar sobrados
adquiriste o ferro de tua cidade. Por muito tempo
não soubeste se teu corpo
tinha mais da matéria orgânica
ou da metálica.

A vida provinciana que ruminavas
em ruelas paradas e poeirentas
tua vida desafogada e escassa de boi resignado e inócuo
e até tua vida exposta cruamente nas livrarias
das pequenas e grandes cidades do país
habita hoje involuntariamente o dia a dia
de banhistas transeuntes taxistas
besuntada em bronze e azinhavre
perfumada de uma inalcançável maresia.

Os miúdos olhos boiando em complacência
mesmo quando alguém lhe rouba os preciosos óculos.
A cabeça francamente doada ao passeio das aves
e às primeiras gotas de chuva
do inverno de Copacabana.

Enfim o metal em ti prevaleceu.
Te veste essa nudez de ferro
que não se dissipa (de estanho e cobre
os teus pecados?). Mas mesmo imóvel e imortal
rígido e indissolúvel como um teorema
ainda pareces — ainda és — humano demais.

Poema de João Lima

Visite o meu blog, que acaba de ser reformulado!
www.comtexturas.blogspot.com

sábado, 5 de novembro de 2011

o indício

maria..

onde combinam estes adereços?
à lua enfileirada no céu(este-tão) obscuro..
à. lentidão destes lapsos de ar..


maria..

é este meu tombo que te compromete?
às minhas sub-visões em raptos/passos de criações-vís?
à condição e sub-humanidade, e
à prova de?


maria..

cortam-me os sonhos.
e a tua febre alivia esta lâmina-fria que deitarei em canto(carnívoro) de ti
à minha culpa. e ao crime de te querer mais(um pouco.)


maria..

versa-me aos ouvidos
deixa-me entre-cortado por uma véspera/moeda qualquer..
me revoluciona o sentido/exercido de vida
e alquebra-me: em-in.comum pátria/alienação..


maria..

Poema de Azke

crava a pele e não toca a alma...

vesti o único vestido sem alça
o mais bonito que já coloquei os olhos
como um barco noturno
rasgando as luas

parece até que tenho um pouco dele
desmanchado no sangue
solto como água
afogando-se em alma

eu lá mesmo com ele acho que morria
com um punhal nas costas
e um coração no peito
indo pra casa...

perdida no fundo do armário

Poema de Vânia Lopez

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A Nuvem e o Fogo




Quando eu era menino
Queria ser bonzinho
Para poder andar sobre as nuvens
Até que um dia comi algodão-doce
E a vontade passou.

Quando eu era menino
Eu não queria ser mau
Pois tinha medo de arder no fogo
Até que um dia senti queimar no meu
O calor de outro corpo
E o medo passou.

Hoje, já adulto, tenho plena consciência
Nessa perplexidade caótica em que me movo
Da poderosa sensibilidade de minha essência
Que insiste em ser metade nuvem, metade fogo.

Marcio Rufino

Recado aos navegantes

- mensagem deixada numa garrafa

se teus olhos buscam apreender o leito
mas não possuem garras de estancar
e segue o corpo ao sabor dos remoinhos
ocupa-te de sobrenadar o éter
viver prescinde de todo o resto

Poema de Jorge Xerxes

www.jorgexerxes.wordpress.com

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Da feira de livros, trago Dostoiévski e Pessoa

Não há nada mais que me anime
melhor do que trazer comigo
um exemplar de Crime
e Castigo.

Ponho debaixo do travesseiro
este recreio q'me afeiçoa:
A obra Cancioneiro
de F. Pessoa.

Zelo como quem devota
ao seu labor inconcusso
a obra Idiota,
do russo.

Trago numa plástica sacola
esta grande literatura
que, se não evola,
cura.

Poema de Isaac Bugarim

nem aos olhos

se.
eu te descobrir(o que me encontro?)
se.
te fossem as luzes(o que mais/me guiaria?)
ontem, ou
passos? em fileiras e chuvas
(as)mesmas. das tuas insensatas poses.
onde?

registram-se ao arbítrio dolente
e
à prepotência(in-salva) de te vivenciar
fugaz..
um(pouco)?

e-o crime de ti..
onde?
culpa..
(onde?)









..



qual à revolta da carne.

à minha cama refrigerada
estaca de tantos aspectos
epístolas destes(intrépidos) épicos de cair
em
situação absurda
clemente
de repente
mas,

em verdade e por alguma exclusão..
por interesse relativo
por

insenção(coincidência..) e desapego:
teu nome, ainda é.


o tempo.todo(o-que te vale)
o outro esboço(ao que ainda nem previ)







..





mas,









mera-linha.
tola-frase(tentada)
passo-de: página(nada! de ti)
nem aqui:
ou ali.



ou:


ainda.este:
pecado-presente
e desdito e editado
é teu(este) conselho:



não.
(nem resposta)
não.
nem.refém..
(ou ali/ou além.)




























Poema de Azke

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Lançamento do Livro "Nuvens" do Poeta Arnoldo Pimentel


      Uma vida é feita de muitos instantes. Em uma visão superficial tais instantes podem parecer corriqueiros, insignificantes e ou  ordinários. Todavia, olhares atentos os re-significam  e lidam com eles dispensando atenção merecida.
Em Nuvens, Arnoldo Pimentel nos convida a apreciação das belas  imagens de instantes simples.  Ele se torna o anfitrião que nos leva da escolha da camisa ao passeio no Leblon.
Aquele que se atenta à beleza da simplicidade, nos leva a questionar sobre a importância dos instantes, sobre o que o efêmero representa em nossa existência. O poeta nos aconselha que apesar da fugacidade do instante, ele é o que torna o que somos, o que vemos e apreciamos. Não atentar-se a isso é evaporar-se na areia, é desejar partir da vida só para não sentir dor.

 Rosilene Jorge dos Ramos

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Quarenta motivos para te amar

O dia amanheceu frio e chuvoso, apesar de plena a primavera. Tomei o meu carro, segui
pela estrada sinuosa, através da paisagem bucólica, o verde vivo a eclipsar a cor cinza do céu, cercavam-me os montes aqui e acolá, com a estrada a desvencilhar-se deles, em vã tentativa.

Um caminhão lento a minha frente carregava folhas secas como se estas fossem barras
de ouro, leves como penas, a circunscreverem fluidos remoinhos no ar, espalhavam a bondade dessa riqueza aos mais pobres – provavelmente ele chegaria vazio ao seu destino. Imaginava que não houvesse nada tão triste quanto à faixa dupla, contínua, amarela: não ultrapasse!

Foi quando me apercebi de uma árvore a captar, inerte, a lúgubre paisagem. Encerrada
ao silêncio de seu tronco, acenando lenços vivos de folhas verdes, intensas, sabe-se lá por que, através dos seus múltiplos ramos, quantos são os braços de Vishnu. E aquilo me deu um aperto no peito, que é como deve se sentir o velho poeta, sem inspiração já há quase um mês.

Quando isso acontece, é comum achar que o mundo se parece mesmo com o branco e o
preto dos jornais, numa sucessão das mesmas coisas, que as pessoas não vão mudar, que a poesia não tem sentido, que ninguém quer saber da luz dos vagalumes, ou do rastro de uma estrela cadente. Acredito: estão todos enganados. Posso provar isso enquanto sopro o dente-de-leão. Mas a minha certeza é efêmera, num segundo, ela desvanece.

Então me dei conta de que hoje é segunda-feira, que estou indo para o trabalho. Só pode ser isso, como naquela seqüência de caricaturas de um carinha com os dias da semana anotados embaixo; porque entendi que ela vai melhorando, à medida que os dias passam. E eu não posso ficar parado.

Há tanta coisa por fazer, para te dizer, dessas coisas urgentes, como uma nuvem, samba num boteco em dia de chuva ou quanto aos poderes afrodisíacos dos bigodes de um gato. Hoje percebi que precisarei ficar até mais tarde, que precisarei fazer serão do fim de semana. Dou um cavalo de pau na pista, a poeira sobe, os motoristas se assustam, metem a mão na buzina. Acho que quase os despertei.

Agora me lembro da noite de ontem: enquanto eu e você estávamos acordados, todos os
outros dormiam.

estrada sinuosa
o coração
aquele verde insuportável
a cor amarela
a cor vermelha
montes aqui e acolá
barras de ouro leves como penas
remoinhos no ar
diamantes comestíveis
a bondade
pernas longas de um grilo
a riqueza
as guelras de um peixe
a inspiração
cartas de baralho
o destino
lenços vivos
folhas imensas
bolinhas de sabão
um poema sem sentido
vagalumes indicando o caminho
tronco de uma árvore
o longo rastro da estrela cadente
nuvem
uma certeza efêmera
dente-de-leão
os bigodes de um gato
a eterna dúvida
samba num boteco em dia de chuva
esticar o fim de semana
cavalo de pau na pista
muita poeira
e mão na buzina
o mar
o sol
uma paisagem bucólica
rede de descansar
um barco distante
vaga lembrança
o movimento dos braços de Vishnu

www.jorgexerxes.wordpress.com


Conto de Jorge Xerxes

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Pode marcar a hora e o lugar

venha bem vestida
na melhor roupa
como se fosse o último bolero
rasgando dentro de mim

beije-me demoradamente
me olhe do jeito que sempre sonhei

numa palavra rude
rasgue-se em pulsos suicidas
em plena Colômbia junto aos guerrilheiros

só não venha no meio de um banho no chafariz
muito menos na melhor noitada
sem futuro que ainda viverei
também não seja besta igual uma queda de chuveiro!

morte acho que vou te matar!
você que mata tudo...
vais morrer em decepção
...já ando morrendo há tanto tempo
(que posso respirar em seu pescoço)
-E te aviso:
a conta não fecha nunca!

(em mel e enxame)

Poema de Vânia Lopez

domingo, 30 de outubro de 2011

A gente se acostuma...

TODO HOMEM É UM EDIFÍCIO

Mito

nada no silêncio
enquanto
tateio
teu rosto marmóreo
— brevíssimo
pequeníssimo
homem
uma sombria
espera
e
porquanto tudo é sonho e
carícias
máquinas além nos espreitam
irmãs
serenas nuvens
viçosas
são teus lábios conjuntos
e
minhas gotas
de pérola
logo atrás
em meio às quais
por intermédio do silêncio
a espera
torna-se
muito.

Órgão

a ferrugem no oxidável
sua gangrena
único meio de amputação

ferro umbilical

da umidade da neblina
a viga escura adoece
escorre no vão, nela, salobras,
ácido puro,
nuvens e nuvens de oxigênio

o desgaste, assim, do todo a nada se compara
elegante ruína

quando enverga sem gravidade
enlaça, sem ruído, a Morte.


Tempo Ausentado

(...)

pouco falta
a prolongar-se
no eixo
a vizinhança das coisas.


Poemas de Sodine Üe

sábado, 29 de outubro de 2011

A carroça de leite

De madrugada eu escutava quase dormindo
O barulho da carroça do "Cabo Quinze"
"Matraqueando" nos "pés-de-moleque" da calçada
Até parar na porta de casa

As garrafas de leite batiam umas nas outras
Deixava o litro no alpendre de casa
Lá com certeza, já estava o pão...
Meu pai, conversava baixinho, eu ouvia

Esperava o jornal que era jogado lá da rua
O barulho agora era o jornal que batia na porta
Meu pai mais que depressa levantava
Queria saber das notícias do dia

Viro na cama
Puxo as cobertas
Ainda bem que hoje é sábado
Durmo novamente!

Poema de Victorvapf

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

The Pirate's Hat: The Giant Man And His Worst Poem

Here I'm, lost, in a city full of lights
learning by the hardest way
to ignore all the sights.

Where were you when they turned off the lights?
When I dreamed alone
things that are already faded and gone?

I'm the worst memory from myself
and, strangely, it is what makes me keep on,
'cause even when I can't rest
there, in my mind, something to hold on.

And what all it means?
Well, I don't care..., thats what I like over it
an open door, and the most beautiful desire of ignoring the exit
for a man that learned that there's no future or past in the dreams.

Poem by Elvys Brito

Tradução:

O Chapéu do Pirata: O Homem Imenso e Seu Pior Poema

Aqui estou eu, perdido, numa cidade repleta de luzes
aprendendo, penosamente,
a ignorar tantas paisagens.

Onde você estava quando as luzes se apagaram?
Quando eu, sozinho, sonhava
coisas há muito mortas e sem brilho?

Sou minha pior lembrança
e, estranhamente, isto é o que me fortalece,
pois, malgrado não consiga descansar,
lá, em minha mente, algo persiste.

Qual o sentido disso tudo?
Ora, não me importo..., este é o meu modo
uma porta aberta, e o mais belo desejo de ignorar a saída
para um homem que aprendeu que não há futuro ou passado nos sonhos.

Poema de Elvys Brito

As irmãs Fox

As pessoas chegavam e sentavam-se ao redor da velha e robusta mesa, de madeira

escura, coberta por uma toalha muito puída, livros religiosos e muitas folhas de

papel em branco, lápis apontados, um tinteiro, duas penas. Mr. Duesler contou os

presentes, fechou a porta, lacrou-a com cera, depois de olhar fixamente para

Margaret e receber o discreto assentimento daquela cabeça jovem e tumultuada. Pensou

por trás do antiquado cavalheirismo, que aquilo tudo,poderia ser uma farsa grotesca,

às custas um trabalho desgraçado, com excelentes dividendos para a fé. Por Deus,

uma vez em ação, aquela frágil criatura suava por todos os poros, rangia a bela

dentadura; num esgar demoníaco e assustador, cruzava os braços, estalando os ossos,

franzia o cenho à maneira dos endemoniados, órbitas brancas por olhos revirados,

tal as estátuas da antiguidade. Nesta noite, acompanhava Mr. Duesler, um homem alto,

magro, jovem, de feições finas, queixo resoluto, modos muito reservados, num olhar

seguro e inquieto, musculoso apesar de magro – indicava-o o relevo de suas

coxas, sob a calça de tweed, enquanto sentava, pensativo com o seu chá, em singular

e cabisbaixa vaidade. Contemplava a mão direita, ostentando um pequeno anel de pedra

vermelha e saliente, no dedo médio, distraidamente girado pelo polegar; uma boca de

lábios finos, emoldurada por um ruivo cavanhaque, envelhecendo-o uns bons dez anos.

Observava agora Kate e Margaret, mas em erudita e curiosa atenção, digamos assim,

quem estuda uma dupla de raros espécimes de borboleta, bem fixados por alfinetes e

sob uma potente lupa. Tudo sob o controle da gaia ciência, pensaria aquele jovem

cético,tão britânico em sua frieza, devolvendo a xícara vazia ao aparador próximo de

sua cadeira. Levantou-se ao aceno de Mr. Duesler.

- Irmãos, apresento-vos o Dr. William Crookes, da Sociedade de Investigações

Psíquicas de Londres, estudioso de fenômenos metafísicos, convidado para observar in

loco o trabalho das irmãs Fox, anunciou a voz empostada de um vaidoso Mr. Duesler.

Apresentou-o primeiramente a Katie, entre sorrisos tímidos, até constrangidos de

ambas as partes. Margaret mantinha-se calada; como de costume, abandonaria o

mutismo, após todos se acomodarem ao redor da velha mesa de carvalho, com uma

vela posta no pesado castiçal, que logo seria acesa, com o desligar da iluminação a

gás,no início dos trabalhos.Katie observava aquele moço velho,sentindo-se assustada,

imaginando a distância percorrida pelo cientista; mais um daqueles movidos pela

fama das irmãs, que faziam girar mesas pesadas e grandes, com auxílio dos espíritos,

ajudando a descobrir e prender o autor de um assassinato que abalara a pequena e

sonolenta Hydesville, alguns anos atrás. Imaginava quanta coisa teria visto um

homem com tanta ciência e liberdade de ir e vir onde quisesse, falar com quem

quisesse,talvez flertar com algumas garotas mais desinibidas,enquanto ela e a

irmã, tornavam-se um tipo de atração circense naquele fim de mundo,conquistando

uma notoriedade que não as impedia de seguir acordando pela madrugada, ordenhando

as vacas, tirando água do poço e ainda cuidando da casa e do pai severo, viúvo desde

os trinta anos, pela tuberculose que lhe tomara a esposa. Hydesville, apenas uma

parada no meio do nada, vizinha de New York apenas três centímetros medidos no

papel do mapa; na prática, um mero intervalo empoeirado entre o nada e coisa nenhuma,

em 1847. Margaret fitava os sapatos londrinos do Dr. Crookes: novos, mas

arranhados, sujos, brigando com o restante de uma aparencia meio dândi para um

cientista, retratado pelos jornais, como uma espécie de caçador de fantasmas,

preciso e implacável com os fraudadores que desmistificara; àquela altura, uma

legião,sentados todos à mesa, as irmãs, Mrs Redfeld vizinha e propagandista de

primeira hora daqueles prodígios, Mr. Duesler, pastor e juiz de paz, sério e

ascético tal um mongeem seu trajar pietista, Dr. Crookes e Stephen

Smith, pai das moças e dono da casa, uma face onde a desconfiança e a mais

autêntica perplexidade alternavam-se em tragicômica sequência. Apagado o bico de

gás, a sala ficou um instante às escuras, até a luz da vela encorpar-se e

ganhar força. Seguiu- se a recitação das orações de costume, por Mr. Duesler;

ao final, um silêncio opressivo dominou a sala; quebrou-o a voz de Margaret,

solicitando dos presentes silêncio e pensamentos voltados para Deus, com um olhar

de soslaio e antipatia para o Dr. Crookes, lembrando do ceticismo que polvilhara

pó de arroz ao redor de todas as cadeiras e solicitara o lacre com a sua própria

cera, da porta da sala – suas condições para publicar um artigo sobre os

fenômenos , na prestigiosa revista da Sociedade de Investigações Psíquicas

de Londres; tirando do território do burlesco e da desconfiança, os

acontecimentos de Hydesville, convencendo o mundo da natureza espiritual e

divina que regia tudo aquilo; uma tese defendida há meses, por Mr. Duesler, de

dedo em riste e face em congesta convicção, durante o culto dominical.

Margaret solicitou que todos se dessem as mãos, para concentrar a energia do

ambiente; seu rosto contraiu-se num espasmo medonho enquanto um frêmito percorria a

mesa em toda sua circunferência,surpreendendo os presentes, que sentiam o móvel

sendo empurrado contra os seus braços, elevando-se do piso. Um forte cheiro de

ozônio saturou rapidamente a sala. Mr. Crookes sentiu todos os seus nervos tensos, a

serviço dos sentidos. Conseguia manter a tranqüilidade, olhando ao redor, mas a semi-

escuridão parecia espessar-se a cada olhar seu. A pesada mesa agora oscilava. Depois

de alguns minutos, retornou lentamente ao solo, o cheiro de ozônio começou a ficar

mais rarefeito. A cabeça de Katie, começou a liberar pelos ouvidos e pela

boca, uma substância vaporosa e luminosa, que parecia expandir-se na progressão

do transe silencioso e trêmulo. À luz mortiça da vela, a substância começou a

condensar-se em duas formas humanas, um homem e uma mulher, rostos indefinidos,

abraçados e nus, em meio a um magnífico e luminoso jardim. A mulher ofereceu uma

maçã ao homem fosforescente, que recebeu a fruta, enquanto uma serpente saía do seu

flanco esquerdo, picando-a furtivamente no pescoço; os rostos indefinidos

eram agora os de Katie e do Dr.Crookes. Exclamações de terror e surpresa

tiveram início, as pessoas ora rezavam aos gritos, ora gemiam de puro medo, voltadas

para uma Katie agora imóvel e de feições serenas. Dr. Crookes, reconheceu a cena de

um antigo livro religioso; estupefato, pulou da cadeira e acendeu o bico de gás; a

substância refluiu imediatamente para o corpo da médium. O cientista aproximou-se de

Kate, a tempo de constatar a sua morte e verificar-lhe o pescoço, perfurado por

dois orifícios diminutos e paralelos,talvez o preço por conhecer o Paraíso.




Conto de André Albuquerque




OBS: Ficção sobre pessoas reais e fenômenos paranormais, observados em 1847 ,

em Amytiville, nos EUA .Os acontecimentos narrados, são produto da imaginação

do autor , exclusivamente .

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

O céu, o ar, o amor, o amar

céu
cu é
é cu


o ar
ora
agora

garoa
chora
aurora

no mar
namora
o ar

ramo
amor
mora
em roma

embora
mera
maré

eram
mear
arme
o mar
o céu

ao léo
óleo
olé
elo
melo
elmo

moar
moer
amar
morrer

roer
o réu
no erro
no céu

eu
caô
oca
coa
o céu
da boca

Poema de Isaac Bugarim

"a referência"

ainda.

referência. e iniquidade
o teu: passo-oblíquo
a tua única(carta)
paragem
(inverdade)
exemplo.
e,


ainda.

meticulosa (in)versão
anagrama de mente
de pele
de repente e ao tempo que te denuncia
eu,


ainda(te sou).










..




qual dispêndio

arma-enviesada
turno e noite
posto-desigual
lado-água
parte: carne.
e
hábito.de te crer
espécie:
tua.
nua.
única.
e,


ainda.

facial
curva-absoluta
multiforme ensejo
pré-vício
pretérito(fixo)
e,


ainda(nome-teu.)

ah,
alicerce..

rege à calha que me contamina
teu lépido erro de me instigar
o teu crime.(acima.. é) absorto de vivência
é facto, e: acto ausente
e

ainda(de ti,)
o sempre.


e a:
referência.









Poema de Azke

Dois em um...



Quem dera todos os dias
Esse olhar, essa alegria.
A vida deu voltas
E numa dessas, trouxe-me você. 


Sinto que você, da minha vida,
Não passará assim sem nada deixar.
Tudo é especial e inebriante
Quando na rua caminho contigo. 

Mãos rústicas que quando tocam em mim
Se convertem, ficam leves.
Sinto o mundo vazio,
Ouço o vento declamar poesias de amor.

Sinto meu coração cheio,
Transbordando emoção.
As sensações são mágicas,
Singelas e pequeninas. 

Quando de repente acordo,
Me vejo sem eira nem beira,
Com meus pés com poeira
E só, sozinha pelas ruas, chorosa. 

Meu caminho é distante do seu,
Mas nossos corações
Caminham em sintonia
Numa só melodia. 

Sinto você em mim,
Mesmo partindo.
Sinto você tocando em mim,
Mesmo estando numa multidão. 

Esse castelo cheio de dragões
Que você criou na sua mente
Para mim são inexistentes,
Apenas um medo profundo de errar. 

Mais somos iguais.
Você não acha,
Se engana o tempo todo
Dizendo isso, aquilo. 

Mais somos um.
Por ironia?
- Creio que por poesia
Poesia torta por aparência
Certa por uma questão de alma.


(( Camila Senna )))